26 de julho de 2016

A violência doméstica prospera na cultura do silêncio da China

O texto abaixo foi traduzido de um artigo do Washington Post. O original pode ser lido aqui.

Por Emily Rauhala

Dois meses depois de Li Hongxia ser assassinada, seu corpo não está enterrado. Ela encontra-se envolta em um edredom rosa em um caixão refrigerado, na casa que ela dividia com o marido. Ele é acusado de mata-la. Sua família, que vivia com eles, fugiu da cidade.

Os pais de Li não acreditam que haverá justiça para as vítimas de violência doméstica. Eles têm visto o sistema falhar para aqueles sem conexões: eles sabem que uma condenação pode requerer influência. Recusar-se a enterrar sua filha, que foi estrangulada, é uma tentativa de fazer as autoridades locais notarem, fazer alguém – qualquer um – se importar.

Na China, como em outros lugares, a violência doméstica é uma epidemia oculta – uma crise de saúde pública rechaçada como escândalo privado, um crime diminuído ou encoberto.

O Estado estima que uma em cada quatro chinesas são agredidas: especialistas acreditam que o número seja maior e apontam que as estatísticas frequentemente excluem outras formas de abuso. Dezenas de milhões estão em risco.

Feministas chinesas lutam por décadas para que o governo note a situação, um esforço galvanizado em anos recentes por uma série de casos brutais. Em 2009, uma jovem chamada Dong Shanshan foi espancada até a morte por seu marido após ir à polícia oito vezes.

Em 2011, Kim Lee, a esposa americana de uma celebridade chinesa, foi a público com fotos de seu rosto agredido e suas tentativas em vão de conseguir ajuda com a polícia. O fato de uma mulher estrangeira rica ter sido ignorada reforça a mensagem que as mulheres chinesas têm ouvido por anos: isso é problema seu. Vá para casa e resolva.

"O amor não é desculpa para a violência". A original pode ser vista aqui.


Desde sua chegada ao poder em 2012, o governo liderado pelo Presidente Xi Jinping tentou transformar o assunto da violência doméstica em uma pedra angular de sua política social. No ano passado, o país aprovou um projeto de lei, o primeiro do seu tipo, voltado para a violência doméstica. Em 1° de março, poucos dias após Li ser assassinada, o projeto se tornou lei.

O projeto foi elogiado como um passo na direção certa. Ainda que não cubra abuso sexual e ignore o casamento de pessoas do mesmo gênero, ele inclui medidas como ordens de restrição que – se requeridas e impostas – poderiam ter ajudado Li. 

Mas a vida curta de Li e sua morte terrível mostram vividamente os limites de usar apenas os tribunais para manter as mulheres a salvo. O órgão ligado ao governo encarregado de proteger as mulheres frequentemente acabam trabalhando contra elas promovendo casamentos a quase qualquer custo, provendo dicas de como “recuperar” parceiros e acreditando que os perpetradores de violência mudarão seu comportamento violento.

No último ano de sua vida, Li sabia que ela precisava de ajuda, mas a ela foi dito repetidamente para que ela voltasse ao seu marido. Enquanto ela lutava, na maioria das vezes sozinha, ela encarava um sistema totalmente mal equipado para salvá-la e uma sociedade que, em sua maioria, não achava que ela precisava de ajuda.