Por René Rémond
"Já fiz alusão à tendência manifestada por vários sociólogos norte-americanos de apresentar comunismo e fascismo como dois ramos do mesmo fenômeno, ao qual lhes apraz colar o rótulo de totalitarismo. E é verdade que não faltam analogias. Nos métodos de governo, entre o terror que Stalin desencadeia sobre a União Soviética e os processos policiais utilizados por Hitler, as semelhanças saltam aos olhos. O mesmo se observa nas estruturas, com a subordinação de todas as instituições legais regulares ao partido, um dos traços mais característicos desses regimes do século XX. Com os regimes fascistas de um lado e o comunismo de outro, já não existe independência nem imparcialidade do Estado. Este é conquistado pelo partido. Há, pois, analogias, mas elas permanecem exteriores; só dizem respeito aos comportamentos, aos processos, à morfologia dos regimes, mas não à sua natureza profunda.
A partir do momento que lhes escrutamos a inspiração e examinamos as ideologias, descobrimos diferenças consideráveis e até contradições nos fins e nas doutrinas. O marxismo-leninismo afirma a universidade da luta de classes; o fascismo procura suprimi-la. Para os fascismos, as diferenças entre as classes são superficiais em face da unidade nacional. Universalista, o marxismo-leninismo tem uma doutrina de valor universal e uma inspiração internacionalista. O fascismo não se preocupa em converter o planeta a seus princípios nem aos seus valores. Na própria media em que a democracia parlamentar representa para o adversário uma fraqueza, o fascismo se guardará de comunicar-lhe sua força.
O fascismo cultiva a diferença, é contra todos os internacionalismos e não somente contra o internacionalismo proletário. Rompe todos os elos que ultrapassam o quadro das fronteiras nacionais: o internacionalismo vermelho proletário do comunismo, ou da social-democracia, ou do sindicalismo, mas também o internacionalismo capitalista da finança "anônima e vagabunda", o internacionalismo negro das Igrejas e, em primeiro lugar, da mais universal, a da Igreja de Roma.
O fascismo exalta a grandeza da nação, aspira à hegemonia da raça ou do povo. Foi, aliás, esse nacionalismo hipertrofiado que por muito tempo impediu os fascismos de descobrir o parentesco existente entre eles, que retardou a tomada de consciência pela Alemanha nacional-socialista e pela Itália fascista das semelhanças entre seus regimes e da solidariedade entre suas políticas: foi preciso esperar as consequências da guerra da Etiópia para que se aproximassem os dois regimes que, retrospectivamente, nos parecem predestinados a fazer causa comum.
Assim, tudo indica mesmo que o fascismo é um fenômeno original, que não se pode reduzir ao conservantismo tradicional nem ao comunismo ou à democracia. Podemos, sem dúvida, encontrar antecedentes para ele, mas a combinação é nova e o distingue radicalmente de todas as experiências anteriores e de todas as correntes de ideias que evocamos no século XVIII e no século XIX."
René Remónd, "O século XX", p. 101-102.