26 de março de 2012

Claude Fohlen - O Faroeste


FOHLEN, Claude. O faroeste. São Paulo: Companhia das Letras; Círculo do Livro, 1989.

            Tendo sido um tema largamente explorado pela literatura, cinema e mesmo música, o Far West, ou faroeste – como é chamado no Brasil – é um vasto território que nem sempre fora o mesmo em extensão. Uma no man’s land que, apesar de seus mistérios, era também repleta de promessas, onde milhares de colonos tentaram a sorte, principalmente a partir da segunda metade do século XIX. Muito do que se sabe – tendo embasamento verídico ou não – chega às mãos da maioria do grande público principalmente através das representações do cinema, desde os clássicos de John Wayne aos icônicos Spagethi Westerns de Sergio Leone e outros, mas muito do conhecimento sobre o período permanece obscuro para esse mesmo público, que recebe nestas produções cinematográficas dezenas de estereótipos fetichistas, desde jogadores e prostitutas a cowboys destemidos portando suas Peacemakers (Colt .45) e fazendo justiça a seu modo. Para o preenchimento de várias destas lacunas, a presente obra, O faroeste, é uma obra de extrema competência.
            Claude Fohlen, então professor de história dos Estados Unidos na Sorbonne na época em que este livro foi lançado (1974, no original), trouxe em uma obra propositalmente generalista, uma compilação de assuntos pertinentes à expansão dos Estados Unidos rumo ao Oeste. O período conhecido como Faroeste possui um recorte geográfico e temporal bem específico, segundo o autor: tem como fronteira com o leste o vale do Mississipi, e tem como recorte temporal os trinta anos entre 1860 e 1890, por vezes transitando antes e depois desse período.
            A obra, parte da coleção A vida cotidiana, tem uma divisão muito clara de temas no decorrer de seus capítulos; assume-se como uma obra introdutória à vastidão de temas cujo aprofundamento é pouco neste caso. Apesar disso, sua fácil leitura e didatismo dão a impressão de que a obra é muito mais completa do que o próprio autor a julga.
            De início, Fohlen discute seu recorte geográfico. Planícies áridas, ventos bravios e vegetação escassa marcam boa parte deste território, onde as variações de temperatura são consideráveis e acidentes imprevisíveis, como nuvens de gafanhotos e tempestades de areia devastam tudo o que encontram pelo caminho. Tais condições, associadas à dificuldade de se chegar a tais territórios – suprimida a partir das construções das grandes ferrovias – fez dessa vasta região um local de baixa densidade demográfica, a despeito das inúmeras propagandas no leste sobre as possibilidades que o oeste oferecia; este considerado uma espécie de Eldorado, teve o seu povoamento não apenas batalhado por agentes imobiliários, mas também facilitado pelo governo. Como resultado, um sem-número de imigrantes foi despejado no Velho Oeste, ávido por povoamento, através das estradas de ferro.
            Conforme dito anteriormente, os temas no livro são bem divididos. Ao fim da introdução, Fohlen começa debatendo o trajeto até o Oeste e o trânsito na região, tanto através de diligências quanto a partir da criação das principais estradas de ferro, como a Union Pacific, Southern Pacific, Northern Pacific, entre outras. Na sequência, o autor parte para análises mais focadas no cotidiano, dedicando os capítulos seguintes aos mineiros, colonos, cowboys e índios, propondo-se a desmistificar muito da imagem consolidada destes indivíduos pelo cinema e outras vias de entretenimento.
            A violência nas cidades – e mesmo a concepção destas cidades – também são abordadas. Claude Fohlen defende a tese de que o Oeste era, de fato, um lugar onde a violência tinha lugar, e onde as disputas entre Desperados e Vigilantes era constante. Linchamentos e enforcamentos eram – no quanto for possível afirmar – corriqueiros e, na mentalidade dos colonos, mesmo necessários. Uma forma de justiça palpável e ao alcance, alívio em um mundo de incertezas onde qualquer indivíduo poderia carregar um revólver no coldre. A vida e a morte, trabalhadas no capítulo VII, fazem um paralelo com tais temas. Fohlen adentra no campo do privado, discutindo a habitação, a alimentação e a saúde, já que pouco se sabe de concreto a respeito. A fé, as crenças destes indivíduos, o ensino, o lazer, muitas são as questões do cotidiano que o autor traz a tona, e a despeito do caráter generalista que a obra possui, o trabalho é muito bem executado.
            Independente de abordar aspectos gerais do Far West, sem, no entanto, se aprofundar nos meandros de nenhum deles pela proposta da obra, o livro é altamente recomendado a qualquer entusiasta do período, não apenas a historiadores. Pessoalmente, não é de meu conhecimento uma vasta bibliografia sobre o período traduzida para o português; logo, este livro é possivelmente a melhor porta de entrada ao tema para o leitor de língua portuguesa. Os livros da coleção “A vida cotidiana” estão há muito esgotados no Brasil, mas ainda é possível encontrá-los em sebos. A reedição de tais obras seria de suma importância para o contato dos historiadores brasileiros com temas diversos, tendo como escopo questões relativas ao cotidiano de diversos períodos e recortes geográficos.
            Para todos que possuem interesse no “faroeste” ou se interessem pela história dos Estados Unidos, este livro é leitura obrigatória.


Preço médio: Esgotado (recomendamos uma busca no site Estante Virtual)

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