O texto à seguir é uma tradução livre de um texto publicado no site Spectator, cujo
original pode ser lido AQUI.
original pode ser lido AQUI.
"A Ministra das Relações Exteriores
feminista sueca ousou falar a verdade sobre a Arábia Saudita. O que acontece
agora é da conta de todos nós."
O posicionamento cheio
de princípios de Margot Wallström merece amplo apoio. Traição parece mais
provável.
Nick Cohen
28 de Março de 2015
Margot Wallström |
Se os gritos de ‘Je suis Charlie’ fossem sinceros, o mundo
ocidental estaria em convulsão, preocupado e indignado com a questão de
Wallström. Ela tem todos os ingredientes para um confronto estilo “Choque das
civilizações”.
Há poucas semanas atrás Margot Wallström, a Primeira-Ministra
de Relações Exteriores, denunciou a subjugação das mulheres na Arábia Saudita.
Como o reino teocrático proíbe mulheres de viajar, conduzir negócios oficiais
ou casar sem a permissão do tutor masculino, e como garotas podem ser forçadas
a casamentos ainda crianças onde elas são efetivamente estupradas por homens
mais velhos, ela não falou mais que a verdade. Wallström condenou as cortes
sauditas por ordenar que Raif Badawi receba dez anos de cadeia e mil chibatadas
por criar um site que luta por secularismo e liberdade de expressão. Estes eram
“métodos medievais”, disse a ministra, e uma “tentativa cruel de silenciar
formas modernas de expressão”. E, uma vez mais, quem pode negar isso?
A repercussão seguiu o padrão estabelecido por Rushdie, as
charges dinamarquesas e o Hebdo. A Arábia Saudita retirou seu embaixador e
parou de emitir vistos para empresários suecos. Os Emirados Árabes Unidos se juntaram
a ela. A Organização para a Cooperação Islâmica, que representa 56 estados
majoritariamente muçulmanos, acusaram a Suécia de faltar com o respeito para
com os “padrões éticos ricos e variados” do mundo – padrões tão ricos e
variados, aparentemente, que incluem o enforcamento de blogueiros e o
encorajamento de pedófilos. Enquanto isso, o Conselho de Cooperação do Golfo
condenou sua “interferência inaceitável em assuntos internos do Reino da Arábia
Saudita”, e eu não apostaria contra tumultos anti-Suécia muito em breve.
Ainda assim, não existe a “questão de Wallström”. Fora da
Suécia, a mídia ocidental mal cobriu a história, e os aliados da Suécia na
União Europeia não demonstraram estar inclinados em apoiá-la. Uma pequena nação
escandinava enfrenta sanções, acusações de islamofobia e talvez coisas piores a
vir pela frente, e todos ficam em silêncio.
E como tantas vezes acontece, o escândalo é que não há um escândalo.
É um sinal de como a política moderna ficou tão transtornada
que uma política que defende a liberdade de expressão e os direitos das
mulheres no mundo árabe seja tomada por uma liberal muscular*, ou neoconservadora, ou ainda uma apoiadora dos
novos partidos de direita populistas cujo comprometimento com a liberdade de
expressão é meramente uma fachada para seu ódio anti-muçulmano. Mas Margot Wallström é aquela raridade
moderna: uma política de esquerda que vai onde seus princípios a levam.
Ela é a Ministra de Relações Exteriores da fraca coalizão
entre Socialdemocratas e Verdes (Partido verde) da Suécia. Ela reconheceu a palestina em outubro do ano
passado – e, não, a Liga Árabe, a Organização Para a Cooperação Islâmica e o
Conselho de Cooperação do Golfo não a acusaram de “interferência inaceitável
nos assuntos internos de Israel”. Eu confesso que seu gesto me pareceu
contraproducente naquele momento. Mas depois de Bejnamin Netanyahu descartar um
Estado palestino enquanto ele usava qualquer jogo sujo que ele pudesse imaginar
para assegurar sua reeleição, ela pode clamar com justiça que a história a
justificou.
Ela foi então para a versão saudita da Sharia. Seu
criticismo não foi apenas retórico. Ela afirmou que era antiético para a Suécia
continuar com seu acordo de cooperação militar com a Arábia Saudita. Em outras
palavras, ela ameaçou a habilidade das companhias armamentistas suecas de fazer
dinheiro. A negação de vistos de negócio a suecos por parte da Arábia Saudita
ameaça prejudicar os lucros de outras companhias também. Você pode ver os
suecos como socialdemocratas justos, que nunca deixam a preocupação de
parecerem tediosos ficar no caminho de sua retidão. Mas isso nunca foi
completamente verdade, e certamente não é verde quando há dinheiro em jogo.
A Suécia é o 12° maior exportador de armas do mundo – uma
conquista e tanto para um país com apenas nove milhões de pessoas. Ela exporta
para a Arábia Saudita um total de $ 1.3 bilhões. Líderes de negócios e
funcionários públicos estão também cientes de que outros países
majoritariamente muçulmanos devem seguir a liderança da Arábia Saudita. Durante
a “Crise dos cartoons” – uma frase que eu ainda não consigo escrever sem bufar
de incredulidade – companhias dinamarquesas encararam ataques globais e a rede
francesa de supermercados Carrefour tirou produtos dinamarqueses de suas
prateleiras para agradar consumidores muçulmanos. Uma campanha coordenada por
nações muçulmanas contra a Suécia não é uma suposição fantástica. Há conversas
de que a Suécia pode perder sua chance de ganhar um assento no Conselho de
Segurança da ONU em 2017 por conta de Wallström.
Para expor a situação da forma mais leve que eu posso, o establishment sueco enlouqueceu. Trinta diretores-executivos
assinaram uma carta afirmando que quebrar o acordo de comércio de armas
“colocaria em risco a reputação da Suécia como um parceiro para comércio e
cooperação”.
Nada menos que Sua Majestade o Rei Carl XVI Gustaf em pessoa
recebeu Wallström no fim de semana para lhe avisar que queria um acordo. A
Arábia Saudita vem transformando com sucesso o criticismo de sua versão brutal
do Islamismo em um ataque a todos os muçulmanos, independente de eles serem
Wahabitas ou não, e Wallström e seus colegas estão claramente enervados pelas
acusações de islamofobia. Tudo indica que ela irá ceder à pressão,
particularmente quando o resto da Europa progressista não demonstra nenhum interesse
em apoiá-la.
Pecados de omissão são tão reveladores quanto pegados de
permissão. O “caso” Wallström nos ensina três coisas. É mais fácil instruir
países pequenos como a Suécia e Israel sobre o que eles podem ou não fazer do
que países como os Estados Unidos e a China, ou uma Arábia Saudita que pode
solicitar um apoio muçulmano global quando criticada. Em segundo lugar, uma
Europa que está ficando cada vez mais velha e mais pobre está começando a achar
que padrões de moralidade em política externa é um luxo pelo qual ela não pode
pagar. A Arábia Saudita tem estado totalmente confiante de que a Suécia precisa
do seu dinheiro mais do que ela precisa de produtos importados da Suécia.
Finalmente, e o mais revelador em minha opinião, o “caso”
nos mostra que os direitos das mulheres sempre vêm em último lugar. Para ter
certeza disso, basta ver as tempestades no Twitter sobre homens sexistas e a
mídia alimentando frenesis toda vez que uma figura pública usa “linguagem
inapropriada”. Mas quando uma política tenta uma campanha pelos direitos das
mulheres sofrendo sob uma cultura clerical misógina e brutal, ela não é
aplaudida; ao invés disso, encarara um silêncio vergonhoso e revelador.
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